quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

A FALÊNCIA DO AMOR

Sinto muito
Se erramos de amor
E afirmamos o querer torto
De um dentro do outro.
O mundo nos az tão pequenos
Que já não sabemos gostar.
Amar se tornou
Um modo de desabrigo
Contra o desejo do outro.

Sinto muito
De todas as formas
Que o querer permite

Não te buscar jamais.

UMA MULHER QUALQUER

Ela não era bonita
E nada tinha de especial.
Era uma mulher banal
E sem grandes qualidades.
Possuía, entretanto,
A rara habilidade
De transformar suas limitações
Em virtude.
Isso a tornava rara
No seu modo de nada ser.
Não era vaidosa
Nem buscava felicidades.
Queria apenas ser uma mulher

Em toda a sua intensidade.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

DECADÊNCIA

Eram dias sem gloria
De um tempo vazio
De novidades.
Era uma vida vazia,
Opaca e provisória,
Onde o sono era mais forte
Do que o sol a pino.
Tudo dizia o deserto,
A espera
E a falta de perspectiva.
Todos os erros já haviam sido
Cometidos,
Todas as verdades já haviam sido
Ditas.
Todos haviam perdido.
E já não éramos os mesmos
Na antiga casa.


domingo, 27 de dezembro de 2015

INTIMIDADE E SEPARAÇÃO

Seu rosto já não era o mesmo de antigamente,
Nem sua presença me causava mais
Qualquer bem estar.
As distancias agora falavam mais fortes
Do que nossa prosa de surdos.
Desfeitos os equívocos do coração
Nos sabíamos como somos,
Sem qualquer ilusão.
Conhecíamos tão profundamente
Nossos defeitos,
Que já não podíamos mais  conviver.
O amor só se realiza plenamente
Quando  afasta.

Eis a lição que demoramos para aprender..

sábado, 26 de dezembro de 2015

A RECUSA DOS OUTROS

Dos afetos soube cedo à inconstância,
Os vazios dos sentimentos
E a precariedade dos laços humanos.
Cresceu sem ter grandes esperanças.
Aprendeu a ficar sozinho
Em sua mais intima segurança.
Não lhe bastavam abraços e beijos.
Queria  viver mais do eu de palavras
De carinho e encanto.
Queria saber as pessoas em tal profundidade
Que tornava impossível conviver com elas.
Seu mundo era feito de desencontros.


quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

SEPARADOS

Esqueça tudo aquilo que eu disse ontem.
Hoje sou outro relendo os fatos
e estou certo dos nossos erros.

Inventamos nossos equívocos
quando nos buscamos
no mais demasiado do humano.

Nosso passado está perdido
e nos separamos de tudo aquilo
que abraçamos um dia
como certeza de vida.

hoje estamos finalmente livres

um do outro.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

A MENINA DEPOIS DO MUNDO


A menina seguia sua vida
Em seus  passos determinados.
Meu olhar colheu o seu rosto,
Sua vontade nos olhos.
Alguma boa nova
Ela levava consigo.
Não tinha dúvida.
Era uma imagem de esperança ,
Determinação e sonho,
Contra os lugares comuns do mundo.

Não precisava saber o seu nome,
Nem adivinhar seu destino.
Me bastava a certeza
De que havia alguma coisa nela
Maior do que toda a minha vida.
A menina seguia em frente,
Indiferente a tudo.
Carregava dentro de si
Uma incomum vontade de ser

O viver da vida.

domingo, 20 de dezembro de 2015

A MISÉRIA DO CASAMENTO

Era uma tarde mansa de domingo onde acordamos preguiçosos e entregues ao ócio e ao grande nada da simples e imediata existência.

Trocávamos palavras vazias e cronometrávamos nossos gestos cotidianos e mecânicos compartilhando o superficial do tempo.
Estávamos juntos, mas isso não queria dizer grande coisa. Muita coisa era mais importante do que estar juntos, do que ouvir a voz um do outro e administrar a intimidade e o tédio das coisas.

Estávamos presos a um relacionamento enfadonho e corriqueiro.  Mas não esperávamos nada da vida alem daquilo. Éramos pobres de imaginação e desejo.


No fundo o mundo é em sua esmagadora maioria feito de pessoas resignadas, conformadas ao pouco do dia a dia. Tratava-se disso: Não esperávamos grande coisa da vida e por isso suportávamos um ao outro sem grandes questionamentos.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

MASTURBAÇÃO A DOIS

Não me diga o que sente
Se teu corpo não falar,
Alem do sexo,
O que o gozo dos afetos
E do provisório do teu desejo
Ensinam ao teu momento
Apesar do vento.

Não me diga  a superfície
De um beijo.
Apenas admita medíocre
Que você não tem nada a dizer

Em nossa masturbação a dois.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

QUANDO JULIETA ABANDONOU ROMEU

Eu e Julieta estávamos juntos a alguns anos. Mas nos últimos tempos enfrentamos um período de crise. Acho que todo casal passa por isso. Afinal, não é fácil dividir o teto com outra pessoa sem viver desacordos e pequenos impasses cotidianos. Chega sempre uma hora em que o relacionamento desanda. Mas o pior já tinha passado e estávamos nos reaproximando e tentando superar aquele  momento difícil. Foi neste contexto que saímos para jantar e depois tomar uma cerveja.
Julieta comeu pouco. Apenas beliscou  o frango com fritas e se pôs a beber. Lá pelo quinto copo de cerveja, após falarmos apenas amenidades ficamos em silêncio por algum tempo e evitando olhar diretamente um para o outro. Havia chegado o momento de colocar as cartas na mesa. Eu sabia disso, mas tentava fugir da situação. Julieta, ao contrário, estava disposta a ir as últimas consequências daquele delicado jantar de conciliação. Logo quebrou o silêncio e começamos um diálogo espinhoso:
- Bom, Romeu, uma coisa que me ocorreu agora. Você acha  que algum dia viveremos algo próximo da felicidade?
Eu fi uma pausa antes de responder aquela pergunta que me parecia totalmente fora da realidade:
- Olha. Eu não sei. Acho que felicidade não existe. A gente vive os momentos. Alguns bons e outros ruins.
- Pode ser. Mas a vida também é feita de períodos. Cada um deles tem um significado pra gente. Os momentos não são despidos de sensações. Quero saber se as sensações que compõe nossos momentos hoje em dia ainda te causam bem estar e significam alguma coisa boa.
-Bem. Você fala de um modo como se já tivesse uma resposta pra isso. Eu só acho que vivemos um período ruim. Mas isso não significa que não podemos concertar as coisas e seguir em frente juntos.
- Você fala como se tudo fosse fácil. Como se bastasse esquecer o passado e viver o futuro. Mas o passado determina nosso futuro.  O futuro que podemos ter depende do passado que acumulamos.
-Nosso passado foi assim ao ruim para você?
- Nós fiemos algumas escolhas. A questão agora é se elas continuam valendo a pena.
- Acho que cometi alguns erros. Você também...
- Pera ai! Não se trata aqui de certo ou errado. A questão é outra. Tive que sacrificar algumas coisas na vida pra ficar com você. Eu não sei se por acaso não é o momento de viver mais pra mim e não para os seus problemas.
- Olha só Julieta, acho que eu também fiz meus sacrifícios.
- Você? Você não passa de um homem que só sabe esperar da mulher. Você nunca se preocupou realmente com o que eu quero ou deixo de querer.
-Mas do que você esta falando?
- eu estou falando de uma vida em comum que caiba dentro de nós dois.
- Você me cobra e me culpa por coisas sem sentido.
-Talvez eu não seja exatamente o tipo de mulher que você pensou...
 Romeu é definitivamente um pulha narcisista como a maior parte dos homens. Fico me perguntando como pude viver tantos anos ao lado dele. E este  jantar idiota para o qual ele me convidou em um boteco  qualquer querendo acertar as coisas quando é mais do que óbvio que a gente não tem mais jeito.
Aceitei vir aqui porque queria ouvi-lo. Ter certeza de que não estava enganada sobre ele. Mas no fundo ele não tem nada a dizer. Só quer que as coisas continuem como estão. Nenhuma autocrítica, nenhum questionamento. Para ele tudo não passa de um mal entendido que precisamos esquecer. Mas o verdadeiro mal entendido é nosso relacionamento. Claro que isso é demais pra cabecinha dele. Definitivamente chegamos ao fim. Isso não tem futuro!
Romeu ficou olhando para mim sem saber o que dizer. Depois cuspiu qualquer resposta tentando dominar a situação:
-Olha Julieta, a gente é um casal como qualquer outro. Temos nossos altos e baixos. Se você esperava viver um conto de fadas, sinto muito. Contos de fadas não existem.
-E quem falou em contos de fada?! É você quem não se entende muito bem com a realidade, quem não consegue enxergar nada além do próprio umbigo.
 Não havia futuro naquele diálogo. Tanto Romeu  quanto Julieta já tinham percebido isso.
 Julieta foi ficando cada vez mais exaltada diante das respostas e argumentações evasivas de Romeu. Chegou uma hora  em que a discussão chamou a atenção das pessoas das outras mesas do restaurante. Uma senhora passou a olhar fixamente para o casal. Queria tomar partido de Julieta. Havia vivido a vida toda para o seu homem e, faz alguns poucos anos, quando içou viúva, percebeu o quanto tinha deixado de lado sua própria vida. A pensão que recebia não pagava seu sacrifício.
Enquanto isso um jovem que jantava com a namorada já pensando em leva-la para o motel depois dali, tinha pena de Romeu. Não entendia como uma mulher podia tratar um cara tão mal. Aquilo não lhe parecia certo. Ai de sua namorada se  algum dia fizesse coisa parecida com ele.
O garçom que servia Romeu e Julieta, um senhorzinho careca e sem muitas imaginações queria mais ver o circo pegar fogo. Para ele importava o espetáculo. Não torcia para nenhum dos dois.
Roubarei do leitor o prazer de uma conclusão. Não direi como terminou esta briga e qual foram suas consequências. Cabe a cada um imaginar aquilo  que lhe parecer mais provável. Afinal temos aqui um cenário mais ou menos previsível....
Afinal, não acho que seja possível  um ponto final. Na verdade estamos lidando com o inicio de  uma situação, com um novo momento para Romeu e Julieta. Não faz diferença se juntos ou separados. Nada mais seria como antes em suas vidas.
Já era quase véspera de ano novo . .. Mas se querem saber minha posição, sinceramente torço por Julieta. Imagino que neste exato momento muitas Julietas estão por ai brigando com seus Romeus. Talvez em condições mais dramáticas e absurdas.  Gostaria de poder ter aqui o depoimento de cada uma delas...



quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

SOBRE AQUELES VERSOS DE AMOR

Aqueles versos de amor,
Quando escritos,
Eram realmente de amor.
Hoje não passam de letra morta,
Como é próprio da natureza do amor.
Aqueles versos de amor
Eram eternos.
Mas a eternidade não existe.
Nem para quem viveu um dia

Um grande amor.

O QUE AINDA SIGNIFICA UM BEIJO?

O que ainda significa um beijo
Em um mundo onde nos desencontramos
De nós mesmos?
Eis a mais humana de todas as perguntas contemporâneas.
Nossos corpos se fazem urgentes na dissolução das coisas
Em uma virtualidade qualquer.
Nos fechamos em vaidades e narcisismos
Contra a maré da incerteza.
Mas isso não nos livra do medo,
Isso não nos torna perfeitos
Ou acima das contradições e desfuncionalidades

Que agora definem tudo que nos é concebível.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

ANATOMIA DE UMA SEPARAÇÃO


1-A SEPARAÇÃO DO PONTO DE VISA DE JACK

Não sabia o que fazer depois que a Jozy resolveu me deixar. Morávamos juntos a quase dez anos. Éramos como um casal como outro qualquer. Cada um vivendo sua rotina, independente um do outro. Ela tinha seu emprego, eu tinha o meu e só nos víamos a noite. Cada um tinha seus sonhos e projetos próprios de vida. Tivemos o bom senso de não ter filhos para nos atrapalhar. Isso facilitava muito as coisas entre a gente. Tínhamos total liberdade para planejar nossas vidas dentro do permitido pelo modesto orçamento doméstico. Não tínhamos bons empregos. Ela era secretaria e eu  um simples funcionário de repartição pública.
Não me perguntem por que ela resolveu ir embora. Nunca brigávamos ou discutíamos por qualquer coisa. Era uma vida tranquila e sem surpresas. Mas um dia ela  ficou meio distante e uma semana depois me chamou para conversar e me notificou de sua  decisão de me deixar. Não ofereceu qualquer bom motivo para isso. Apenas disse que não queria mais continuar dividindo o mesmo teto comigo. Queria começar um momento novo em sua vida. Quando lhe perguntei se havia outro cara, ela sorriu e disse que não se tratava disso.  Eu acreditei.
Nosso relacionamento havia caído em uma rotina vazia. Eu não me dei conta da gravidade disso. Mas estávamos vivendo como dois estranhos. Cada um levando a própria vida, apesar de dividir o mesmo teto. Uma hora ela se deu conta que não precisava mais de mim, que eu não fazia qualquer diferença para ela. O que era uma verdade. Estávamos vivendo como dois dementes e um apenas alimentava a demência do outro. Era uma vidinha sem sal, estragada pela rotina vazia e pela absoluta falta de perspectiva.
Cabe esclarecer que não éramos do tipo romântico. Não levávamos muito a sério as ilusões do amor. Nem trepávamos direito, se permitem a franqueza. Mas isso nunca tinha sido um problema. Apenas não tínhamos um relacionamento dos mais quentes, mas estávamos bem acomodados a ele. Nós gostávamos um do outro. Mas de um modo bem peculiar.
Não posso negar que me senti mal quando ela me disse que estava indo embora. Mas não tinha muito o que argumentar. Não fui capaz de persuadi-la do contrário, pois não tinha um único argumento que pudesse ser convincente. Então ela se foi e o apartamento que me parecia pequeno nunca se revelou tão grande.
Não faz muito sentido para mim ficar lamentando o fato. A questão é o que vou fazer da minha vida agora. Jozy garantia a rotina doméstica. Apesar de trabalhar fora, cuidava da casa e mantinha as finanças sobre controle. Eu, ao contrário dela, não tenho o mínimo talento para isso. Desde que ela foi embora o apartamento deixou de ser um lar e passou a lembrar mais alguma espécie de acampamento onde tudo é feito meio de improviso.
Pensando sobre isso agora, me ocorreu que, talvez, minha completa omissão nos rumos da economia domestica podem ter contribuído para decisão dela. Afinal, não devia ser fácil trabalhar fora e ainda manter a casa em ordem. Mas eu não sou do tipo que cuida da casa. Ela sabia disso e não parecia se importar.
Eu devia era procurar outra mulher para botar no lugar dela. Mas já tinha passado dos cinquenta e não tinha mais a mínima paciência para sair flertando por aí tipo um adolescente. Isso me parecia fútil e , possivelmente, inútil. Não tinha muito dinheiro, não era bonito.... Que tipo de mulher ia acabar comigo a esta altura da vida?
Além disso, havia outro problema. Uma parte de mim tendia a não aceitar o fim do relacionamento. Sentia que Jozy ainda era minha, apesar de sua decisão de ter indo embora. Minha vontade era trazê-la de volta ou, simplesmente, esperar que em algum momento ela caísse em si e voltasse para mim. È engraçado admitir isso. Mas nutria este tipo de fantasia. Quando voltava para casa a noite e encontrava o apartamento vazio eu pensava e sentia essas coisas. Eu era um completo idiota como a grande maioria dos outros homens. Pensava que uma mulher deveria viver para mim, cuidar de mim. Tenho certeza que ela não vai encontrar nenhum cara diferente de mim por ai.
Não gostava da ideia de não vê-la de novo. Mas ela não me disse exatamente para onde ia. Apenas arrumou suas coisas enchendo três grandes malas e disse que ficaria um tempo na casa de uma amiga. Eu nem sabia que ela tinha amigas. Aliais, sabia muito pouco de sua vida fora de casa. 
Jozy foi a única mulher com a qual morei junto. Antes dela tinha tido apenas alguns casos e muitas aventuras. Nada sério. Namoramos por um ano antes de decidirmos morar sobre o mesmo teto. A decisão foi meio pragmática. A vida ia ficar mais barata para os dois com a divisão das despesas. Mas eu gostei da coisa, me habituei a ela.  Não estava preparado para voltar a estar sozinho depois de tanto tempo. Acho que terei que arrumar um cachorro....

2- A SEPARAÇÃO DO PONTO DE VISTA DE JOZY

Creio que Jack foi uma das piores coisas que aconteceram na minha vida. Quando o conheci eu estava um pouco fragilizada. Meu pai havia morrido e queria um pouco de companhia. No inicio ele era carinhoso e atencioso. Era o que eu precisava naquele momento. Namoramos e  chegou uma hora em que conversamos sobre morar juntos. Parecia conveniente dividir as contas e a vida com ele. Nossa situação financeira nunca foi das melhores.
Mas ao longo dos anos morando juntos descobri nele uma pessoa distante e vazia. Não tinha exatamente um companheiro dentro de casa.  Ele estava sempre mais disponível para o amigos dele do que pra mim.  Ele nunca lembrava da data do meu aniversário, nunca saiamos juntos para jantar ou ir ao cinema. Ele me tratava mais como uma empregada cjua função era manter a casa em ordem.
Apesar das poucas oportunidades que tive na vida eu ainda cultivava alguns sonhos. Pensava em fazer uma faculdade, conseguir um emprego melhor. Queria crescer. Ele, ao contrário, era profundamente acomodado com tudo e sua única ambição era encher a cara de cerveja todo fim de semana.
Não sei como conseguir aguentar tudo isso durante dez anos. Engraçado como eu evitava reclamar de tudo. Tendia a naturalizar aquela constante falta de atenção, aquele descaso como sendo apenas um modo dele ser. Afinal, os homens não são todos assim? Não adiantaria reclamar. Era o que eu pensava. Mas não me sentia melhor  por isso. Muitas vezes chegava em casa querendo que ele não estivesse lá, que eu não tivesse que dividir a mesma cama com ele.
Nós nunca nos amamos. Mas durante algum tempo fomo bons amigos. Nos últimos anos, entretanto, a amizade foi se degenerando em indiferença e, no meu caso, se convertendo em uma espécie de aversão. Eu o culpava pelo  homem que ele não era.  Chegou um ponto em que eu não podia mais conviver mais com aquela situação.
Não foi fácil sair de casa. Contei com a ajuda de uma amiga minha do trabalho, a Magy. Sem ela não teria tido coragem. Hoje moro com ela temporariamente. Tenho algumas economias e estou tentando conseguir  outro emprego.
Eu espero não velo novamente e continuar minha vida. No dia em que fui embora ele me pareceu um pouco diferente, meio sombrio. Tive medo dele. Achei que podia ficar violento. Acho que ele não aceitou muito bem a ideia de separação. Talvez por ter tido o orgulho ferido e se sentido rejeitado. Em alguns momentos da nossa despedia disse palavras duras pra ele tentando expressar o quanto estava infeliz.
Mas não quero perder meu tempo falando sobrei isso. Quero esquecer o passado. Já passei dos cinquenta e não tenho tempo para lamentar aquilo que foi. Meu futuro é feito de urgências.

3-A SEPARAÇÃO DO PONTO DE VISTA DO APARTAMENTO DO EX CASAL

Não sou a voz de qualquer ente mítico ou entidade fantástica. Sou  apenas um discurso sem voz, um ato de imaginação que personifica os fatos em sua impessoalidade e sem o crivo das interpretações subjetivas de seus próprios atores. Sou exatamente aquilo que eles ignoram. Por tanto não tenho existência. Mas seria um erro me ignorar.
Nenhum dos discursos produzidos pelo casal aqui em questão corresponde realmente aos fatos. Eles levavam uma vida rotineira e tediante. Mas mantinham uma relação de auto dependência psicológica muito interessante.
Jozy era uma garota ambiciosa que viu em Jack alguém suficientemente submisso a ela para fazer todas as suas vontades. Foi dela a ideia de morarem juntos e, durante algum tempo,  ela manteve esperanças na possibilidade de Jack melhorar de vida e lhe garantir uma situação materialmente mais confortável na vida. Jack, por sua vez, era apenas um sujeito medíocre e sem ambições . Bastava aquela vidinha que levava certa e segura.
Havia, portanto, desde o inicio uma incompatibilidade entre os dois.  O que os levou a um envolvimento mais intimo foi a ocasional trepada propiciada em uma noite de bebedeira na qual se conheceram na celebração do aniversário de um amigo comum. Havia uma química sexual entre eles se perdurou por muito tempo e sustentou o envolvimento.
A verdade é que ambos nunca foram capazes de lidar de modo muito consequente com a vida e projetaram um no outro as fantasias mais oportunistas daquilo que consideravam um relacionamento porcamente feliz. Era natural que tudo  chegasse ao fim um dia.
A lição que podemos tirar da história dos dois é o quanto as pessoas tendem a ser ingênuas em suas escolhas afetivas e optam sempre movidas por cálculos subjetivos que transcendem o simples envolvimento afetivo.
Mas esta é a avaliação de uma voz que não existe, mas que encontra-se muda nas entrelinhas de ambos os discursos anteriormente apresentados.


domingo, 6 de dezembro de 2015

NÃO CONFIEM EM AMANTES

O amor pode ser considerado uma espécie de doença, um estado singular de entorpecimento da consciência.
Trata-se da forma mais complexa de narcisismo, pois pressupõe o outro como espelho de si mesmo, como objeto de fantasia e desejo.

Através do amor buscamos ser mais do que nossa elementar finitude , viver mais do que a concretude dos fatos e, nos casos mais radicais, fazer do outro a meta de nossa própria existência.

Amantes nunca são razoáveis, fecham-se em sua fantasia infantil e através dela reinventam o mundo dominados por uma passionalidade que flerta com o absurdo e o irrazoável.

Jamais confie nas considerações de um amante.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

O ABISMO DO DIÁLOGO

Dentro de todo diálogo
Há sempre qualquer coisa ilegível,
Algo que escapa ao dizer
E no fundo do outro se inventa
No acontecer subjetivo do eco
Daquilo que foi dito

No se perder das intenções
Do pensamento
Os motivos  se inventam
Através do crivo das interpretações.

Então não me cobrem coerência.
As opiniões transcendem os discursos.
Tudo que digo sempre ganha um outro sentido
Na luz do teu ouvido.


terça-feira, 1 de dezembro de 2015

A IGNORÂNCIA DO OUTRO

Em nossas perdidas horas de afetos,
Nudez e carências
Escrevemos em nós mesmos
A marca de um engano,
De uma ilusão cujo futuro
Só poderia ser  a transgressão.
Pois só se ama aquilo que se supera,
O que  tornamos tão  familiar
Que desconhecemos em si mesmo.
Eis o grande segredo do amor:

A ignorância do outro.