Creio eu que o grande mérito do
niilismo é nos afastar das ilusões e frágeis certezas do senso comum. Seu
mérito é nos fazer refletir sobre a vida a partir da consciência de nossa
intima finitude. Emil Cioran é um mestre desta arte, como prova o fragmento
abaixo de NOS CUMES DO DESESPERO:
Ser Lírico
“Por que não podemos morar
isolados em nós mesmos? Por que nós perseguimos a expressão e a forma,
procurando esvaziar-nos de todo o conteúdo, por meio de um processo caótico e
rebelde? Não seria mais fecundo abandonar-nos à essa fluidez interior, sem preocupação
objetiva, limitandonos a gozar de todas as nossas efervescências e agitações
íntimas? Vivências múltiplas e diferenciadas fundiriam-se assim para engendrar
uma das mais fecundas efervescências, semelhante a um movimento de marés ou a
um paroxismo musical. Estar cheio de si, não no sentido do orgulho, mas da
riqueza; sentir-se feito de um infinito interior, numa tensão extrema - isto
significa viver intensamente, intensamente a ponto de sentir-se morrer de
viver. Tão raro é este sentimento, e tão estranho, que nós deveríamos vivê-lo
aos gritos. Preciso morrer de viver e me pergunto se existe algum sentido em
buscar explicações. Assim que o passado da alma palpita em nós numa tensão
infinita, ou que num dado momento retornam todas as experiências vividas e um
ritmo perde seu equilíbrio e seu padrão, a morte nos prende aos cumes da vida,
fazendo-nos provar, perante um tal terror, a mais dolorosa obsessão. Sentimento
análogo àquele dos amantes que, no cume da alegria, vêem surgir em frente a
eles, fugitiva embora intensamente, a imagem da morte. Ou como, quando nos
momentos de incerteza, emerge, em meio a um amor ainda nascente, a premonição
do fim ou do abandono.”






